Ás oito em ponto, chega o ex-piloto da
Marinha dos Estados Unidos acompanhado dos filhos, cada um deles carregando um
pacote. Eram fotos inéditas, em preto e branco, de todas as partes da aeronave,
e desenhos de detalhes internos e externos, além de um manual original. ´´Inacreditável``.
Na hora da preparação para o voo, o comandante, com entonação solene, convida o
combatente aposentado para ser seu copiloto. ´´Você está falando sério?``,
pergunta o homem, cuja expressão de alegria transforma o convite em um momento
inesquecível para todos que ali estão. Os filhos perdem a voz. É o axioma da
fraternidade entre aviadores.
O comandante pede ao veterano um briefing e o
convida a fazer a checagem pré-voo. Parado, como se estivesse sentindo a presença
dos fantasmas dos seus ex-companheiros, o sobrevivente de incontáveis ataques
dos zero (caça japonês Mitsubishi A6M tipo O) sobre o Pacífico sabia que seria
seu último voo. Os anos e a dor desaparecem e o aeronauta inicia uma minuciosa
checagem, como se nunca tivesse deixado de fazê-la. A tripulação sobe a bordo
e, em instantes, ouve-se o rugido dos 2.000 HP de cada um dos dois motores Pratt
& Whitney do Harpoon. Mais alguns minutos e o avião inicia a corrida. A
grande cauda deixa o solo e o bombardeiro parece se equilibrar sobre o trem
principal. Logo, está no ar. Ele sobre circulando o aeroporto, depois desce e,
com os flaps e o trem de pouso abaixados, faz um suave toque na pista, rola
vários metros sobre o trem principal e, quando parece que irá abaixar a cauda
para terminar o voo, acelera mais uma vez. A aeronave sobe rapidamente fazendo
uma apertada curva à esquerda antes de nivelar.
´´Acho que seu pai
está se divertindo``, diz um dos membros da equipe aos filhos do ilustre
tripulante. O Harpoon aumenta sua velocidade. De repente, inclina-se quase a
90°, faz uma curva fechada e mergulha como um falcão, em direção ao solo. É
possível ouvir o bramido dos motores a quilômetros. ´´O que é que ele está
fazendo?``, uns perguntam enquanto outros largam cachorros-quentes e
refrigerantes com o intuito de pegar câmeras e capturar o que está por
acontecer. O avião ruge sobre a linha de voo. O Harpoon passa em um piscar de
olhos sobre Mustangs e Flying Fortress. Bebês choram, mulheres cobrem os
ouvidos e crianças gritam eufóricas, A turbulência faz bonés, programas e copos
coarem em todas as direções. O avião balança as asas e sobe em direção ao céu.
Desaparece...
Alguns instantes de expectativa e alguém grita:
´´Olhem, lá está ele, na direção do Sol!``. Com o Sol nas costas, o bombardeiro
começa um novo mergulho, mas, desta vez, o faz de forma peculiar. ´´Há algum
problema?``, pergunta um adolescente ao pai, vendo o Harpoon mudar de direção
rapidamente, para a direita e para a esquerda, com se estivesse sem controle.
Na plateia, porém, experientes pilotos de combate sabem o que está acontecendo:
o avião cumpre uma manobra chamada ´´Jinking``, para evitar o fogo inimigo
vindo do solo. Em ação evasiva, o Harpoon ganha velocidade a um ritmo
alarmante, 260 nós, 270, 290!. A aeronave, então, assume voo em linha reta e
continua a mergulhar em direção ao público. As portas do porão de bombas se
abrem e meia dúzia de objetos quase esféricos são lançados. Os espectadores
acompanham os projéteis que caem assobiando, até atingirem o solo numa
espetacular explosão vermelha e verde. É um bombardeio com melancias!
O tenente-comandante
Francis (frank) Petterson faleceu em 20 de Janeiro de 1993. Até Hoje, seu nome
está escrito sob a janela esquerda do cockpit do PV-2 Harpoon.
Nota: Esse texto foi publicado na Revista Aero Magazine, ano
18, N°212, Janiero de 2012.
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